Ewá é escondida por seu irmão Oxumaré
Filha de Nanã também é Ewá. Ewá é o horizonte, o encontro do céu com a terra. É o encontro do céu com o mar. Euá era bela e iluminada, mas era solitária e tão calada. Nanã, preocupada com sua filha, pediu a Orunmilá que lhe arranjasse um amor, que arranjasse um casamento para Ewá. Mas ela desejava viver só, dedicada à sua tarefa de fazer criar a noite no horizonte, mandando sol com a magia que guarda na cabeça adô. Nanã porém, insistia em casar a filha.
Ewá pediu então ajuda a seu irmão Oxumarê. O Arco-Íris escondeu Ewá no lugar onde termina o arco de seu corpo. Escondeu Ewá por trás do horizonte e Nanã nunca mais pôde alcançá-la. Assim os dois irmãos passaram a viver juntos, lá onde o céu encontra a terra. Onde ela faz a noite com seu adô.
Ewá livra Orunmilá da perseguição da morte.
Orunmilá era um babalaô que estava com um grande problema. Orunmilá estava fugindo da morte, de Icu, que o queria pegar de todo jeito. Orunmilá fugiu de casa para se esconder. Correu pelos campos e ela sempre o perseguia obstinada. Correndo e correndo, Orunmilá chegou ao rio. Viu uma linda mulher lavando roupa. Era Ewá lavando roupa junto à margem. ”Por que corres assim, senhor? De quem tentas escapar?” Orunmilá só disse: ”hã, hã”. Foges da morte? Adivinhou Ewá. ”Sim”, respondeu ele.
Ewá então o acalmou. Ela o ajudaria. Ewá escondeu Orunmilá sob a tábua de lavar roupa, que na verdade era um tabuleiro de Ifá, com fundo virado para cima.E continuou lavando e cantando alegremente. Então chegou Icu, esbaforida. Feia, nojenta, moscas envolvendo-lhe o corpo, sangue gotejando pela pele, um odor de matéria putrefata empestando o ar. A morte cumprimentou Ewá e perguntou por Orunmilá. Ewá disse que ele atravessara o rio e que àquela hora devia estar muito, muito longe, muito alem de outros quarenta rios.
Ewá tirou Orunmilá de sob a tábua e o levou para casa são e salvo. Preparou um cozido de preás e gafanhotos servido com inhames bem pilados. À noite Orunmilá dormiu com Ewá e Ewá engravidou. Ewá ficou feliz pela sua gravidez e fez muitas oferendas a Ifá. Ewá era uma mulher solteira e Orunmilá com ela se casou. Foi uma grande festa e todos cantavam e dançavam. Todos estavam felizes. Ewá cantava: ”Orunmilá me deu um filho”. Orunmilá cantava: ”Ewá livrou-me da morte”. Todos cantavam: ”Ewá livra de Icu”. Todos cantavam: ”Ewá livra de Icu”.
Ewá se desilude com Xangô e abandona o mundo dos vivos.
Ewá filha de Obatalá, viva enclausurada em seu palácio. O amor de Obatalá por ela era possessivo. A fama de sua beleza chagava a toda parte, inclusive aos ouvidos de Xangô. Mulherengo como era, Xangô planejou seduzir Ewá. Empregou-se no palácio para cuidar dos jardins. Um dia Ewá apareceu na janela e deslumbrou-se com o jardineiro. Ewá nunca vira um homem assim tão fascinante.
Xangô deu muitos presentes a Ewá. Deu-lhe uma cabaça enfeitada com búzios, com uma obra por fora e mil mistérios por dentro, um pequeno mundo de segredos, um adô. E Ewá entregou-se a Xangô. Ele fez Ewá muito infeliz até que ela renegou sua paixão.
Decidiu se retirar do mundo dos vivos e pediu ao pai que a enviasse a um lugar distante, onde homem algum pudesse vê-la novamente. Obatalá deu então a Ewá o reino dos mortos, que os vivos temem e evitam. Desde então é ela quem domina o cemitério. Ali ela entrega a Oyá os cadáveres dos humanos, os mortos que Obaluaê conduz a orixá Oco, e que orixá Oco devora para que voltem novamente à terra, terra de Nanã de que foram um dia feitos. Ninguém incomoda Ewá no cemitério.
Notas bibliográficas
Mitologia dos Orixás – Reginaldo Prandi – 2001