quarta-feira, 13 de outubro de 2010

CULTURA IORUBÁ - DA ÁFRICA PARA O NOVO MUNDO - 3ª PARTE

PARTE FINAL
Jihadistas também pilharam cidades iorubás em busca de escravos.

Esses terríveis anos de incessante guerra civil são, de fato, duplamente significativos. Embora a exportação de escravos africanos para as Américas terminasse por volta de 1870-1875, um incontável número de iorubás foi vendido como escravo entre essas datas.

Primeiro, muitos foram capturados como escravos durante os 50 anos das guerras civis iorubás (±1790-1840).

Além disso, a queda final império fez da terra dos iorubás território livre para caçadores de escravos que vinham da Europa e dos Estados africanos vizinhos. E, na verdade, houve senhores da guerra iorubá e sùmomí (seqüestradores profissionais) que pilharam as cidades e aldeias atrás de cativos que eram vendidos aos europeus como escravos.

De fato, a captura de iorubás como escravos continuou até bem depois da abolição oficial do comércio transatlântico de escravos.

De maneira simples, os iorubás foram exportados em grandes números para fora da África Ocidental um pouco antes, durante e um pouco depois dos últimos dias do comércio de escravos - para a controvérsia em torno das estimativas sobre o número de africanos exportados como escravos ver Inikori (1976a e 1976b) e Curtin (1969 e 1976).

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Creditos.:

Trecho do livro Yoruba Culture: A Philosophical Account, escrito por Kola Abimbola - professor da Universidade de Leicester,U.k. (Iroko Academic Publishers Ltd). Tradução de Léo Silva.
PUBLICADO EM 02/08/2005

CULTURA IORUBÁ - DA ÁFRICA PARA O NOVO MUNDO - 2ª PARTE


Por exemplo, o Basorun, que era o líder do Oyo Mèsì, era também o sumo sacerdote de Orun. Orun era a divindade pessoal de todos os imperadores Oyo.
Porém, perto do fim do império, alguns chefes de alta patente aceitaram versões radicais e fanáticas do islã.

Portanto, havia um conflito em sua lealdade para com a estrutura político-religiosa do império. Por um lado, eram cobrados pelo islã a renunciar e forçosamente a derrubar a religião iorubá e todas as suas instâncias. Porém, por outro lado, em razão de seus cargos tinham o dever de manter as medidas constitucionais e religiosas que se fundavam em uma religião que eles não mais aceitavam!

Um dos mais importantes inimigos do alafim Awole e que orquestrou sua deposição era Àfonjá, o Bale (governante) da cidade de Ìlorin. Àfonjá era também Are-Ona-Kaka-n-fo, quer dizer líder do exército provincial do império.
Porque Àfonjá descendia, por parte de mãe, de uma das famílias reais de Oyo, ele nutrira a ambição de tornar-se alafim no lugar do fraco Awole.

Infelizmente para Àfonjá, apesar de ter apoio do Oyo Mèsì em seu golpe de Estado contra o alafim Awole e de ser a seleção de novos imperadores uma de suas principais responsabilidades, a Oyo Mèsì não selecionou Àfonjá como imperador após o suicídio de Awole. Ao contrário, selecionou Adébo, um dos príncipes de Awole.

Contudo, a escolha de Adébo era inconstitucional! A constituição não permitia príncipes que fossem sucessores diretos de seus pais no trono. De fato, nos tempos antigos, o príncipe mais velho teria que cometer suicídio toda vez que o imperador reinante morria. A razão era muito simples.

Todo alafim era visto como um semideus - especificamente o representante de Xangô (deus do raio, do trovão e da justiça). Como semideus, o alafim era reverenciado e ele raramente aparecia em público. Nestas raras ocasiões, sua face era sempre envolta por um véu de pelotas de sua coroa pesadamente adornada.

Por ser o alafim um semideus que não estava em contato com seus cidadãos, o filho mais velho, todo alafim reinante tinha o importante título de Aremo. O Aremo, para todos fins e propósitos, tinha mais influência na sociedade em que seu pai era o imperador porque ele era a face pública do governante, da autoridade e do poder. Ele também era os "olhos" e "ouvidos" de seu pai, o alafim, na sociedade.

Em muitos casos, o Aremo era mais temido que o próprio alafim. Era por esta razão que, nos tempos antigos, todo Aremo deveria cometer suicídio quando seu pai morresse. O novo imperador seria selecionado então de uma das casas governantes de Oyo.

Àfonjá não aceitara docilmente a eleição de Adébo. Como ele era o Are-Ona-Kaka-n-fo, comandava um exército que era maior que o permanente da capital. Junto com alguns de seus aliados, Àfonjá repudiou sua lealdade à autoridade do alafim como líder do velho império Oyo. O império finalmente foi tomado por guerras civis.

Entre a deposição do alafim Awole (por volta de 1796) e o colapso final do império, em torno de 1840, não houve nada menos que doze guerras civis de grandes proporções no império.
O significado desse meio século de guerras para a dispersão do povo iorubá não deve ser perdido de vista. Antes de 1789, quando Awole sobe ao trono de velho Oyo, os povos iorubás não foram escravizados em números significativos porque a "confederação" de cidades-estado e reinos que formavam o império tinham um dos exércitos mais fortes da África Ocidental.

Porém, entre mais ou menos 1800 e 1870, os iorubás tornaram-se o maior número de escravos a serem "exportados" das costas da África. Pois, além do fato de muitos senhores da guerra iorubá venderem seus cativos (que também eram iorubás) como escravos, os Nupe e os Bariba (que eram vizinhos dos iorubás a Norte e a Nordeste) também capturaram e venderam um incontável número de iorubás como escravos.

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CULTURA IORUBÁ - DA ÁFRICA PARA O NOVO MUNDO - 1ª PARTE

O que levou ao colapso o velho império Oyo? Uma versão popular da história oral é que o império caiu porque o alafim Awole (1789-c.1796), fraquíssimo imperador que sucedeu ao alafim Abiodun (c.1774-1789), rogou uma praga no povo iorubá!

Awole fora removido do cargo e, como previsto pela constituição do império, teve que cometer suicídio. Segundo a lenda, seus chefes o depuseram do cargo porque queriam que o império começasse a participar do lucrativo comércio de escravos. A constituição do império demandava a unanimidade entre o imperador e o Oyo Mèsì (seu importante Conselho de Chefes). Oyo Mèsì tinha oito membros e não sete como erroneamente foi informado por muitos escritores, estes são: Basorun, Agbakin, Samu, Alápìíni, Lágùnà, Akinnikú, Asípa e Onàa-Modéékè.

Qualquer imperador que não pudesse conseguir a unanimidade entre ele e Oyo Mèsì era deposto e tinha que cometer suicídio. Essa previsão fora inserida na constituição como uma medida "democrática" para proteção contra a autocracia real. Ainda segundo a lenda, antes de cometer suicídio, Awole proferiu a maldição: "o povo será escravizado por toda a Terra". Após proferir a maldição, ele disparou uma flecha para o Norte, Leste e Oeste e esmagou no chão um pote contendo poderes ocultos. "Assim como ninguém remenda o pote esmagado, ninguém será capaz de reverter minha maldição sobre o povo iorubá". Isto é o que se conhece por Ègún Awóle, a irreversível maldição de Awóle.

Há, naturalmente, uma melhor explicação para o porque do colapso do império. Essa explicação diz respeito a vários problemas constitucionais inerentes ao império.

A constituição continha certas medidas que tornavam difícil, senão impossível, para um dirigente fraco sobreviver muito tempo como imperador. Para começar, embora os títulos de alafim e da Oyo Mèsì fossem hereditários, a constituição continha tendências democráticas que estavam em conflito com esses cargos hereditários.

Por exemplo, suponha-se que os membros da Oyo Mèsì fossem a "boca" do povo porque suas opiniões eram moderadas e formadas por vários grupos sociais e organizações dentro da sociedade. Uma dessas organizações era a poderosa sociedade Ogbóni. Os Ogbónis eram mais ou menos cortes de apelação em cada cidade-estado do império.
Embora a cidade de Oyo fosse a capital, ela também funcionava como qualquer outra dentro da confederação que era o império. A cidade de Velho Oyo tinha seu próprio Ogbóni que limitava os poderes do Oyo Mèsì.

Depois, as decisões do Oyo Mèsì e do alafim tinham que ser tomadas unanimemente, muito embora o alafim não fosse, estritamente falando, um membro do conselho executivo. Isso acontecia porque o Oyo Mèsi deliberava independentemente do imperador, somente depois que chegavam às suas conclusões eles as apresentariam ao imperador. Se houvesse uma disputa irreconciliável entre o alafim e o Oyo Mésí, o alafim seria deposto do cargo porque o Oyo Mèsì era visto como a voz do povo.

Ademais, no dia-a-dia os assuntos do império eram conduzidos por eunucos que a literatura inapropriadamente se refere como "escravos". Estes eunucos, chamados Ìlàrí, eram dirigidos por três eunucos muito poderosos: Ona Efá (eunuco do meio), Otun Efá (eunuco da direita) e Òsì Efá (eunuco da esquerda).

Em todas as questões essenciais, estes eunucos eram mais poderosos que a Oyo Mèsì porque eram responsáveis pelas questões administrativas do império. Eles também eram coletores de impostos e enviados que viajavam por todo o império (ver Law, 1971-1977, para mais detalhes dos problemas constitucionais do velho império Oyo).

Outra lacuna do poder é que não havia separação real entre religião e Estado. O imperador e o Oyo Mèsì eram os mais altos líderes das divindades mais importantes da religião iorubá.

O alafim era reverenciado como representante de Xangô,o deus iorubá do trovão, do raio e da justiça.Cada um dos oito membros do Oyo Mèsì eram também líderes de uma importante divindade ioruba.


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CONCEITOS DE VIDA E MORTE NO RITUAL DO AXEXÊ - 6ª PARTE

PARTE FINAL

Hoje, com a grande e rápida expansão do candomblé, o axexê parece estar em franca desvantagem com relação às demais cerimônias. Sobretudo em São Paulo, onde o candomblé não completou sequer cinqüenta anos, poucos terreiros dispõem de sacerdotes e sacerdotisas capazes de cantar e conduzir o rito fúnebre, obrigando a comunidade, em caso de morte, a se valer dos serviços religiosos de pessoa estranha ao terreiro, que costuma cobrar e cobrar muito caro pelo serviço.

Vários adeptos do candomblé, que se profissionalizam como sacerdotes remunerados, especializam-se em axexê. São então chamados para a cerimônia quando um terreiro necessita de seus préstimos. Isto, evidentemente, encarece muito a cerimônia, o que acaba por inviabilizá-la na maioria dos casos.

Mesmo quando morre um sacerdote dirigente de terreiro, há grande dificuldade para a realização dos ritos funerários, sobretudo naquelas situações em que a morte do chefe leva ao fechamento da casa, provocada tanto por disputas sucessórias, como por apropriação da herança material do terreiro pela família civil do falecido. Vale lembrar que se pode contar nos dedos os terreiros que, por todo o Brasil, sobreviveram a seus fundadores.

Em geral, a família do finado não tem qualquer interesse em realizar o axexê e nem está disposta a gastar dinheiro com isso. Por outro lado, pouquíssimos pais e mães-de-santo, sobretudo em São Paulo e no Rio de Janeiro, se dispõe a realizar qualquer tipo de cerimônia sem o pagamento por parte do interessado, mesmo quando o interessado é membro de seu próprio terreiro. Muitos pais e mães-de-santo mantêm terreiros especialmente como meio de vida, de modo que as regras do mercado suplantam em importância e sentido as motivações da vida comunitária.

Ao que parece, o empenho das comunidades de culto na realização dos ritos funerários, na maioria dos casos, é muito reduzido quando comparado com o interesse, esforço e empenho despendidos nos atos de iniciação e feitura, como se, com a morte, pouca coisa mais importasse. Cria-se assim uma situação em que a preocupação em completar o ciclo iniciático vai perdendo importância, alterando-se profundamente, em termos litúrgicos e filosóficos, a concepção da morte e, por conseguinte, a própria concepção da vida.

Os conceitos originais africanos de vida e morte vão se apagando e o candomblé vai cada vez mais adotando idéias mais próximas do catolicismo, do kardecismo e da umbanda, criando-se, provavelmente, uma nova religião, que hoje já se esparrama pela cidades brasileiras a partir de São Paulo e Rio de Janeiro, e que muitos chamam, até pejorativamente, de umbandomblé, em que os eguns, que são na concepção iorubá ancestrais particulares de uma específica comunidade, vão perdendo suas características africanas para se transformar em entidades genéricas, não ligadas a nenhuma comunidade de culto em particular, que baixam nos terreiros para "trabalhar", assumindo a justificativa da caridade, ideal e prática cristã-kardecistas que aos poucos vão suplantando os modelos africanos de ancestralidade e seus ideais de culto à origem e valorização das linhagens.

Esta nova maneira de pensar a morte e vida por grande parte dos adeptos do candomblé, sobretudo os de adesão mais recente, constitui forte razão para a crescente perda de interesse na realização do axexê para todos os iniciados. Com isso, certamente, ganham terreno as concepções e ideais da umbanda e perdem as do candomblé.

Isto é o contrário do movimento de africanização e já há muito se constituiu num processo oposto, o da umbandização do candomblé. Sem axexê, a feitura de orixá não faz sentido, pelo menos nos termos das tradições africanas que deram origem à religião dos orixás no Brasil. O ciclo simplesmente não se fecha e a repetição mítica, tão fundamental no conceito de vida segundo o pensamento africano, não pode se realizar. 



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TEXTO
Conceitos de vida e morte no ritual do axexê:
Tradição e tendências recentes dos ritos funerários no candomblé.
por Reginaldo Prandi
Prof. Titular de Sociologia da Universidade de São Paulo
http://www.fflch.usp.br/sociologia/prandi/

Referências bibliográficas
ABRAHAM, R. C. Dictionary of Modern Yoruba. Londres, Hodder and Stoughton, 1962.
BABAYEMI, S. O. Egungun among the Oyo Yoruba. Ibadan, Oyo State Council for Arts and Culture, 1980.
BRAGA, Júlio. Ancestralidade afro-brasileira: o culto de babá egum. Salvador, CEAO e Ianamá, 1992.
LAWAL, Babatunde. The Gèlèdé Spectacle: Art, Gender, and Social Harmony in an African Culture. Seatle, University of Washington Press, 1996.
PRANDI, Reginaldo. Os candomblés de São Paulo: a velha magia na metrópole nova. São Paulo, Hucitec e Edusp, 1991.
____. Herdeiras do axé: sociologia das religiões afro-brasileiras. São Paulo, Hucitec, 1996.
SANTOS, Juana Elbein dos. Os nàgó e a morte. Petrópolis, Vozes, 1976.
SANTOS, Maria Stella de Azevedo. Meu tempo é agora. São Paulo, Odudwa, 1993. 




 

CONCEITOS DE VIDA E MORTE NO RITUAL DO AXEXÊ - 5ª PARTE

Quando, no final, o despacho é levado para longe do terreiro, tudo juntado num grande balaio, nenhum objeto religioso de propriedade do morto resta no templo.Ele não faz mais parte daquela casa e só futuramente poderá ser incorporado ao patrimônio dos ancestrais ilustres, se for o caso, podendo então ser assentado e cultuado. Por ora, o egum está livre para partir.

Igualmente, o orixá ou orixás pessoais do falecido já não dispõem de assentos (ibá-orixá) no terreiro, tendo portanto seus vínculos desfeitos.O ori, que pereceu junto com seu dono, também não mais existe fixado num ibá-ori (assentamento).Se algum objeto ou assento foi dado a alguém, ele tem novo dono, para quem é transferida a responsabilidade do zelo religioso.

Nada mais é do morto.
Nada mais há que o prenda ao terreiro.

Durante o axexê, acredita-se que o morto pode expressar suas últimas vontades e para isso o sacerdote que preside o ritual faz uso constante do jogo de búzios.Assim, antes de cada um dos objetos religiosos que lhe pertenceram em vida ser desfeito, rasgado ou quebrado, o oficiante pergunta no jogo se tal peça deve ficar para alguém de seu círculo íntimo. Não é de bom-tom, contudo, deixar de despachar pelo menos grande parte dos objetos.

Quando se trata de fundador de terreiro ou outra pessoa de reconhecidos méritos sacerdotais, é costume deixar os assentos de seus orixás principais para o terreiro, os quais passam a ser zelados por toda a comunidade.Não raro,
assentos de orixás de mãe e pais de grande prestígio costumam ser disputados por filhos com grande estardalhaço, havendo mesmo relatos de roubos e até de disputas a faca e bala.

O axexê é realizado no terreiro em dois espaços: num recinto reservado, preferencialmente uma cabana especialmente construída com galhos e folhas, e no barracão. Na cabana, em que poucos entram, são colocados os objetos do morto, onde são desfeitos, aí se realizando os sacrifícios para os orixás e para o egum. No barracão são celebradas as danças, aí permanecendo os membros do terreiro, os parentes e amigos do finado.

O morto é representado no barracão por uma cabaça vazia, que vai recebendo moedas depositadas pelos presentes, no momento em que cada um dança para o egum. Todos devem dançar para o egum, como homenagem pessoal. Apesar dos cânticos e danças, o clima da
celebração é propositalmente constrito e triste. Os atabaques são substituídos por um pote de cerâmica, do qual se produz um som abafado com uso de leques de palha batidos na boca, e por duas grandes cabaças emborcadas em alquidares com água e tocadas com as varetas aguidavis.

Os presentes usam tiras da folha do dendezeiro, mariô, atadas no pulso, como proteção contra eventual aproximação dos eguns.Todo esse material, ao final, comporá o carrego do morto. No barracão também é servido o repasto preparado com as carnes do sacrifício,reservando-se aos ancestrais, orixás e egum as partes que contêm axé.

No quarto reservado, o morto é representado por recipientes de barro ou cerâmica virgens, os quais futuramente podem ser usados para assentar o espírito do falecido juntamente com os demais antepassados ilustres daquela comunidade religiosa, ou despachados.
Por influência do catolicismo, que costuma repetir a missa fúnebre em intervalos regulares, em muitos terreiros o rito do axexê é repetido depois de um mês, um ano e a cada sete anos, especialmente quando se trata do falecimento do babalorixá ou ialorixá.

Mas a maioria dos iniciados, entretanto, acaba não recebendo sequer um dia de axexê.Isto ocorre por falta de interesse da família carnal do morto, muito freqüentemente não participante do candomblé, por dificuldades financeiras, já que é alto o custo da celebração, ou por incapacidade do pessoal do terreiro para oficiar a cerimônia. Na melhor das hipóteses, os otás,pedras sagradas dos assentamentos, são despachadas com um pouco de canjica, reaproveitando-se todos os demais objetos sagrados. 





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CONTINUA

CONCEITOS DE VIDA E MORTE NO RITUAL DO AXEXÊ - 4ª PARTE

Sendo o candomblé uma religião de transe, várias divindades participam ativamente do rito funerário, especialmente os orixás associados à morte e aos mortos, ocupando Oiá ou Iansã lugar de destaque. Iansã é considerada o orixá encarregado de levar os mortos para o orum, atribuindo-se a ela o patronato do axexê, conforme mito narrado por Mãe Stella Odé Kaiodé, ialorixá do Axé Opô Afonjá, que resume bem a idéia do axexê como cerimônia de homenagem ao morto.

Assim diz o mito:

“ Vivia em terras de Queto um caçador chamado Odulecê.
Era o líder de todos os caçadores.
Ele tomou por sua filha uma menina nascida em Irá,
que por seus modos espertos e ligeiros foi conhecida por Oiá.
Oiá tornou-se logo a predileta do velho caçador,
conquistando um lugar de destaque entre aquele povo.

Mas um dia a morte levou Odulecê, deixando Oiá muito triste.
A jovem pensou numa forma de homenagear o seu pai adotivo.
Reuniu todos os instrumentos de caça de Odulecê
e enrolou-os num pano.

Também preparou todas as iguarias que ele tanto gostava de saborear.
Dançou e cantou por sete dias,
espalhando por toda parte, com seu vento, o seu canto,
fazendo com que se reunissem no local todos os caçadores da terra.
Na sétima noite, acompanhada dos caçadores,
Oiá embrenhou-se mata adentro
e depositou ao pé de uma árvore sagrada
os pertences de Odulecê.

Nesse instante, o pássaro "agbé" partiu num vôo sagrado.
Olorum, que tudo via,
emocionou-se com o gesto de Oiá-Iansã
e deu-lhe o poder de ser a guia dos mortos
em sua viagem para o Orum.

Transformou Odulecê em orixá
e Oiá na mãe dos espaços sagrados.
A partir de então, todo aquele que morre
tem seu espírito levado ao Orum por Oiá.
Antes porém deve ser homenageado por seus entes queridos,
numa festa com comidas, canto e dança.
Nascia, assim, o ritual do axexê. “ (Santos, 1993: 91).

Também participam do axexê os orixás Nanã, Euá, Omulu, Oxumarê, Ogum e eventualmente Obá, não se incluindo, contudo, nesta lista Xangô, que dizem ter pavor de egum, conforme narram outros mitos.

A seqüência do axexê começa imediatamente após a morte, quando o cadáver é manuseado pelos sacerdotes para se retirar da cabeça a marca simbólica da presença do orixá, implantada no alto do crânio raspado durante a feitura, através do oxo, cone preparado com obi mascado e outros ingredientes e fixado no coro cabeludo sobre incisões rituais.

O cabelo nesta região da cabeça é retirado e o crânio lavado com amassi (preparado de folhas) e água. Esta lavagem da cabeça inverte simbolicamente o primeiro rito iniciático, quando as contas e a cabeça do novo devoto são igualmente lavadas pela mãe-de-santo. O líquido da lavagem é o primeiro elemento que fará parte do grande despacho do morto.
Depois do enterro, tem início a organização do axexê propriamente dito.

Ele varia de terreiro para terreiro e de nação para nação. É mais elaborado quando se trata de altos dignatários e depende das posses materiais da família do morto. Genericamente conserva os procedimentos básicos de inversão da iniciação, havendo sempre:
1.música, canto e dança;
2.transe, com a presença pelo menos de Iansã incorporada;
3.sacrifício e oferendas variadas ao egum e orixás ligados ritualmente ao morto, sendo sempre e preliminarmente propiciado Exu, que levará o carrego, evidentemente, e os antepassados cultuados pelo grupo;
4.destruição dos objetos rituais do falecido (assentamentos, colares, roupas, adereços etc.) podendo parte permanecer com algum membro do grupo como herança;
5.despacho dos objetos sagrados "desfeitos" juntamente com as oferendas e objetos usados no decorrer da cerimônia, como os instrumentos musicais próprios para a ocasião, esteiras etc.

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CONCEITOS DE VIDA E MORTE NO RITUAL DO AXEXÊ - 3ª PARTE

Com a morte, estes ritos são refeitos, agora com a intenção de liberar essas unidades espiritiais, de modo que cada uma deles chegue ao destino certo, restituindo-se, assim, o equilíbrio rompido com a morte.

No Brasil, nas comunidades de candomblé e demais denominações religiosas afro-brasileiras que seguem mais de perto a tradição herdada da África, a morte de um iniciado implica a realização de ritos funerários. O rito fúnebre é denominado axexê na nação queto, tambor de choro nas nações mina-jeje e mina-nagô, sirrum na nação jeje-mahim e no batuque, ntambi ou mukundu na nação angola, tendo como principais fins os seguintes:

1.desfazer o assentamento do ori, que é fixado e cultuado na cerimônia do bori, cerimônia que precede o culto do próprio orixá pessoal;

2.desfazer os vínculos com o orixá pessoal para o qual aquele homem ou mulher foi iniciado, o que significa também desfazer os vínculos com toda a comunidade do terreiro, incluindo os ascendentes (mãe e pai-de-santo), os descendentes (filhos-de-santo) e parentes-de-santo colaterais;

3.despachar o egum do morto, para que ele deixe o aiê e vá para o orum. Como cada iniciado passa por ritos e etapas iniciáticas ao longo de toda a vida, os ritos funerários serão tão mais complexos quanto mais tempo de iniciação o morto tiver, ou seja, quanto mais vínculos com o aiê tiverem que ser cortado (Santos, 1976).

Mesmo o vínculo com o orixá, divindade que faz parte do orum, representa uma ligação com o aiê, pois o assentamento do orixá é material e existe no aiê, como representação de sua existência no orum, ou mundo paralelo. Mesmo um abiã, o postulante que está começando sua vida no terreiro e que já fez o seu bori, tem laços a cortar, pois seu assento de ori precisa ser despachado, evidentemente numa cerimônia mais simples.

Em resumo, podemos dizer que a seqüência iniciática por que passa um membro do candomblé, xangô, batuque ou tambor de mina (bori, feitura de orixá, obrigações de um, três e cinco anos, decá no sétimo ano, obrigações subseqüentes a cada sete anos) representa aprofundamento e ampliação de laços religiosos, quando novas responsabilidades e prerrogativas vão se acumulando: com a mãe ou pai-de-santo, com a comunidade do terreiro, com filhos-de-santo, com o conjunto mais amplo do povo-de-santo etc.

Com a morte, tais vínculos devem ser desfeitos, liberando o espírito, o egum, das obrigações para com o mundo do aiê, inclusive a religião. O rito funerário é, pois, o desfazer de laços e compromissos e a liberação das partes espirituais que constituem a pessoa. Não é de se admirar que, simbolizando a própria ruptura que tal cerimônia representa, os objetos sagrados do morto são desfeitos, desagregados, quebrados, partidos e despachados.

O termo axexê, que designa os ritos funerários do candomblé de nação queto e outras variantes de origem iorubá e fom-iorubá, ou jeje-nagô, como são mais conhecidas, é provavelmente uma corruptela da palavra iorubá àjèjé. Em terras iorubás, por ocasião da morte de um caçador, era costume matar-se um antílope ou outra caça de quatro pés como etapa do rito fúnebre. Uma parte do animal era comida pelos parentes e amigos do morto, reunidos em festa em homenagem ao defunto, enquanto a outra parte era levada ao mato e oferecida ao espírito do falecido caçador.

Juntamente com a carne do animal, depositavam-se na mata os instrumentos de caça do morto. A este ebó dava-se o nome de àjèjé (Abraham, 1962: 38). O axexê que se realiza no candomblé brasileiro pode ser pensado como um grande ebó, com a oferenda, entre outras coisas, de carne sacrificial ao espírito do morto, e no qual se juntam seus objetos rituais.

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CONCEITOS DE VIDA E MORTE NO RITUAL DO AXEXÊ - 2ª PARTE

Também não sobreviveu integralmente a idéia de abicu e o termo passou a designar, em muitos candomblés, as pessoas que são consideradas como tendo nascido já iniciadas para o orixá a que pertencem, não devendo, assim, ser raspadas, como devem ser os demais que se iniciam na religião. A maneira fragmentária como a religião africana foi se reconstituindo no Brasil implicou, claramente, em acentuadas mudanças nos conceitos de vida e morte, mudanças que vão afetar o sentido de certas práticas rituais, especialmente quando sofrem a concorrência de ritos católicos e de concepções ensinada pela Igreja.

A tradição cristã ensina que o ser humano é composto de corpo material e espírito indivisível, a alma. Na concepção iorubá, existe também a idéia do corpo material, que eles chamam de ara, o qual com a morte decompõe-se e é reintegrado à natureza, mas, em contrapartida, a parte espiritual é formada de várias unidades reunidas, cada uma com existência própria.

As unidades principais da parte espiritual são 1) o sopro vital ou emi, 2) a personalidade-destino ou ori, 3) identidade sobrenatural ou identidade de origem que liga a pessoa à natureza, ou seja, o orixá pessoal e 4) o espírito propriamente dito ou egum. Cada parte destas precisa ser integrada no todo que forma a pessoa durante a vida, tendo cada uma delas um destino diferente após a morte.

O emi, sopro vital que vem de Olorum e que está representado pela respiração, abandona na hora da morte o corpo material, fabricado por Oxalá, sendo reincorporado à massa coletiva que contém o princípio genérico e inesgotável da vida, força vital cósmica do deus-primordial Olodumare-Olorum. O emi nunca se perde e é constantemente reutilizado.

O ori, que nós chamamos de cabeça e que contém a individualidade e o destino, desaparece com a morte, pois é único e pessoal, de modo que ninguém herda o destino de outro. Cada vida será diferente, mesmo com a reencarnação.

O orixá individual, que define a origem mítica de cada pessoa, suas potencialidades e tabus, origem que não é a mesma para todos, como ocorre na tradição judaico-cristã (segundo a qual todos vêm de um único e mesmo deus-pai), retorna com a morte ao orixá geral, do qual é uma parte infinitésima.

Finalmente, o egum, que é a própria memória do vivo em sua passagem pelo aiê, que representa a plena identidade e a ligação social, biográfica e concreta com a comunidade, vai para o orum, podendo daí retornar, renascendo no seio da própria família biológica. Quando se trata de alguém ilustre, os vivos podem cultuar sua memória, que pode ser invocada através de um altar ou assentamento preparado para o egum, o espírito do morto, como se faz com os orixás e outras entidades espirituais.

Sacrifícios votivos são oferecidos ao egum que integra a linhagem dos ancestrais da família ou da comunidade mais ampla. Representam as raízes daquele grupo e são a base da identidade coletiva.
Na África tradicional, dias depois do nascimento da criança iorubá, realiza-se a cerimônia de dar o nome, denominada ekomojadê, quando o babalaô consulta o oráculo para desvendar a origem da criança.

É quando se sabe, por exemplo, se se trata de um ente querido renascido. Os nomes iorubás sempre designam a origem mítica da pessoa, que pode referir-se ao seu orixá pessoal, geralmente o orixá da família, determinado patrilinearmente, ou à condição em que se deu o nascimento, tipo de gestação e parto, sua posição na seqüência dos irmãos, quando se trata, por exemplo daquele que nasce depois de gêmeos, a própria condição de abicu e assim por diante. A partir do momento do nome, desencadeia-se uma sucessão de ritos de passagem associados não só aos papéis sociais, como a entrada na idade adulta e o casamento, mas também à própria construção da pessoa, que se dá através da integração, em diferentes momentos da vida, dos múltiplos componentes do espírito.

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... Continua

CONCEITOS DE VIDA E MORTE NO RITUAL DO AXEXÊ - 1ª PARTE


Nas mais diferentes culturas, a concepção religiosa da morte está contida na própria concepção da vida e ambas não se separam. Os iorubás e outros grupos africanos que formaram a base cultural das religiões afro-brasileiras acreditam que a vida e a morte alternam-se em ciclos, de tal modo que o morto volta ao mundo dos vivos, reencarnando-se num novo membro da própria família. São muitos os nomes iorubás que exprimem exatamente esse retorno, como Babatundê, que quer dizer "O-pai-está-de-volta".

Para os iorubás, existe um mundo em que vivem os homens em contato com a natureza, o nosso mundo dos vivos, que eles chamam de aiê, e um mundo sobrenatural, onde estão os orixás, outras divindades e espíritos, e para onde vão os que morrem, mundo que eles chamam de orum. Quando alguém morre no aiê, seu espírito, ou uma parte dele, vai para o orum, de onde pode retornar ao aiê nascendo de novo. Todos os homens, mulheres e crianças vão para um mesmo lugar, não existindo a idéia de punição ou prêmio após a morte e, por conseguinte, inexistindo as noções de céu, inferno e purgatório nos moldes da tradição ocidental-cristã.

Não há julgamento após a morte e os espíritos retornam à vida no aiê tão logo possam, pois o ideal é o mundo dos vivos, o bom é viver. Os espíritos dos mortos ilustres (reis, heróis, grandes sacerdotes, fundadores de cidades e de linhagens) são cultuados e se manifestam nos festivais de egungum no corpo de sacerdotes mascarados, quando então transitam entre os humanos, julgando suas faltas e resolvendo as contendas e pendências de interesse da comunidade.

O papel do ancestral egungum no controle da moralidade do grupo e na manutenção do equilíbrio social através da solução de pendências e disputas pessoais, infelizmente, não se reproduziu no Brasil.

Embora o culto ao egungum tenha sido reconstituído na Bahia em uns poucos terreiros especializados, o candomblé de egungum da Ilha de Itaparica (Braga, 1992), mais tarde também presente na cidade de Salvador e em São Paulo, está muito distante da prática diária dos candomblés de orixás e praticamente divorciados da vida na sociedade profana, perdendo completamente as funções sociais africanas originais, de tal modo que a religião africana no Brasil, disseminada pelos terreiros de orixás, acabou por se constituir numa religião estritamente ritual, uma religião a-ética, uma vez que seus componentes institucionais de orientação valorativa e controle do comportamento em face de uma moralidade coletiva exercitada nos festivais dos antepassados egunguns ausentaram-se completamente da vida cotidiana dos seguidores da religião dos orixás.

O ideal iorubá do renascimento é as vezes tão extremamente exagerado, que alguns espíritos nascem e em seguida morrem somente pelo prazer de rapidamente poder nascer de novo. São os chamados abicus (literalmente, nascido para morrer), que explicam na cultura iorubá tradicional as elevadas taxas de mortalidade infantil. Em geral, um abicu renasce seguidamente do útero da mesma mãe.

Quando uma criança é identificada como sendo um abicu, muitos são os ritos ministrados para impedir sua morte prematura. Assim como a sociedade Egungum cultua os antepassados masculinos do grupo (Babayemi, 1980), outra sociedade de mascarados, a sociedade Gueledé, celebra a mães ancestrais, às quais cabe também zelar pela saúde e vida das crianças, inclusive os abicus (Lawal, 1996).

Os festivais Gueledé não sobreviveram no Brasil (segundo o Professor Agenor Miranda Rocha, em conseqüência de disputas, no começo do século, entre lideranças do candomblé da Casa Branca do Engenho Velho, que provocaram a cisão do grupo e fundação do Axé Opô Afonjá por Mãe Aninha Obá Bií).

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Créditos ao final do último texto.

LENDAS DE IKÚ - MORTE

Tudo o que nasce um dia morre. Qualquer coisa, animal ou indivíduo, mais dias ou menos dias morrerá.
 
Se pensarmos bem, veremos que a vida e a morte  são faces da mesma moeda:  a existência.
Em nossa cultura ocidental em geral, ensinaram-nos a temer a morte, como se ela fosse a pior coisa que poderia nos acontecer. E, ainda desde criança, criaram em nossas mentes algumas imagens para esteriotipar a morte como a figura de alguém vestido com uma túnica longa, usando um capuz cobrindo não somente a cabeça, mas, escondendo a face que nunca aparece, por estar sempre na penumbra formada por esse capuz; ou então, uma outra figura também  de túnica longa, com o rosto de uma caveira, também com a cabeça encoberta por um capuz e segurando em suas mãos um grande cajado terminado em feitio de foice; isto, para enfatizar a função do “ceifador de vidas”, de quem ninguém jamais escapará.

A história Yorùbá como sabemos, é pródiga em pequenas lendas; para tudo ou quase tudo há sempre uma historinha explicando o porque daquilo. Como não poderia deixar de ser, Ikú (a Morte), também tem suas histórias interessantes. E uma delas conta que:
Ikú, era um jovem guerreiro, forte e muito bonito. Sua beleza era tamanha que impressionava tanto às mulheres quanto aos homens.
As mulheres encantavam-se tanto com sua bela figura que onde quer que o vissem, acompanhavam-no só para poderem continuar admirando aquela criatura tão encantadora. Não podiam desviar os olhos dele.
Os homens, embora tentassem disfarçar ou não quererem admitir que estavam encantados com a beleza de Ikú, também acabavam seguindo-o. Alguns do tipo machão, diziam que seguiam-no somente por curiosidade de saber quem era e onde morava.
Só que Ikú morava no Igbó-Ikú (Floresta dos Mortos ou Floresta da Morte), de onde quem quer que fosse até lá e entrasse, jamais sairia; nunca mais seria visto, pois  fora para o Igbó-Ikú.
E todo o encanto e beleza de Ikú, tinham justamente o objetivo de chamar a atenção das pessoas e atraí-las, e que inadvertidamente seguiam-no e adentravam no Igbó-Ikú, o reino dos mortos, onde, evidentemente, o rei era o próprio Ikú e de onde não é permitido a ninguém retornar, uma vez ali adentrado.

Em outra história, Ikú está ligada ao mito da criação dos seres humanos. Conta a lenda que Olódùmarè, ao decidir criar o ser humano, designou essa incumbência  Òòsààlà, que teve  a necessidade de obter o material adequado para aquele propósito. Pensou e achou que o melhor material  para moldar os seres humanos seria  amòn (o barro) formado pela mistura de terra e água. Então, Òòsààlà que fora incumbido daquela tarefa por Olódùmarè, ordenou a  Èsù o mensageiro, que fosse buscar um pouco de lama para que Ele pudesse executar sua tarefa.
Como era corrente e sabido por todos, não havia nada que Èsù não pudesse realizar, e  a tarefa parecia super fácil para ele. Mas, ao chegar ao local, quando Èsù meteu a mão na lama arrancando-a, Ayé (a Terra) chorou porque estavam arrancando parte dela e ela sentia muita dor com aquilo. Embora Èsù tivesse fama de mau e implacável, ficou mortificado de pena de Ayé e deixou a lama para lá. Regressou a Òòsààlà e relatou o acontecido.
Òòsààlà então chamou Ògún, este sim, guerreiro intrépido e destemido que em batalhas matava o inimigo até mesmo brincando, resolveria aquele pequeno problema. E lá se foi Ògún. Em lá chegando, quando ele retirou a lama para colocar em sua làbà (bolsa capanga), Ayé caiu em prantos lamentando-se. Ògún também ficou penalizado ora, Ayé não lhe fizera nada de mal e ele não estava zangado, e assim, não tinha ímpeto suficiente para feri-la. E também voltou a Òòsààlà para explicar o seu fracasso em cumprir sua missão.
Assim, um a um dos Òrìsà que foram incumbidos por Òòsààlà para aquela  mesma missão, voltava com a mesma desculpa: ninguém foi capaz de tirar a lama de Ayé, cada qual com suas qualidades que o recomendava  com a certeza do cumprimento da tarefa, mas, tudo em vão.
Foi aí  que Òòsààlà  chamou Ikú, deu-lhe a àpò (bolsa) e mandou-o para executar a tarefa que todos os demais Ìmolè tinham fracassado em cumprir. Então, Ikú ao chegar na terra começou a retirar a lama de Ayé, e ela chorou, mas, Ikú não se importou com  o pranto dela  e  pegou toda a lama de que precisava e retornou a Òòsààlà com sua missão cumprida.

Então, após moldar os seres humanos, Òòsààlà plantou uma árvore para cada um, para que ela lhe suprisse o oxigênio e desse continuidade à respiração, iniciada pelo sopro divino de Olódùmarè  pois,  Olódùmarè o Criador Supremo, insuflou o seu hálito (èémí) para dar vida e mobilidade aos seres humanos.  E disse a Ikú que, como fora ele quem retirara o material necessário para moldar os seres humanos, em qualquer época que se fizesse necessário, ele estaria também incumbido de levá-lo de volta para recolocar em seu lugar de origem, após a utilização daquele  material.  Por isso é, que quando chega a época da devolução daquela porção do material primordial, Ikú é quem vem buscar a pessoa para recolocá-la em seu lugar  original.
Visto assim, do ponto de vista das lendas Yorùbá, Ikú (a Morte) não é aquela coisa tenebrosa que nos incutiram desde a mais tenra idade. Ikú, para os Yorùbá tradicionais é ao mesmo tempo, o fornecedor primordial e o restaurador da matéria retirada e fornecida por Ele próprio, sendo Ele assim o princípio e fim,  o princípio e o fim e, e o princípio e o fim..., e assim sucessivamente, num eterno círculo, onde não há início nem final, que está sempre recomeçando.


ÌKÚ - A MORTE - 2ª PARTE FINAL

2-Odú Òyékú Meji:

Iwo ko jinki aiyelujara
Mo ko jinki fifunni
Oyeku Meji biri farahan
Nwon o yokuro ti wa ajiri
N ti mbo òrun fun ile basi imole, ojuran
Igbanã, mo ni, mo gbodo owo
Mo so-asoye
Òyékú Meji:
Òrúnmìlà ye, tisiwaju mi won ihinrere
Nwon gbogbo ojulowo, Órunmìlà jinki fun mi o
Nwon gbogbo ire to ba nwu mi o
Mo dahun
Òyékú Meji:
Òrúnmìlà ni o yere temi femi

2-Tradução: (livre)

Ele não deu licença
Eu não dei permissão
Òyékú Meji apareceu de repente
Eles deduzem que está alvorecendo
Consultaram o Oráculo para Òyékú Meji
Aquele que veio do céu para a terra, como uma luz, uma visão,
Então, eu digo, que quero dinheiro
Eu falo claramente
Òyékú Meji
Òrúnmìlà é quem fará todas as minhas vontades, colocará diante de mim boas novas
Todas as coisas verdadeiras, Òrúnmìlà me dará
Toda a sorte que eu desejo
Eu falo
Òyékú Meji
É Órúnmìlà que trará coisas boas.

Devemos estar cientes que temos sempre ter um acompanhamento através do jogo, para que a morte não nos pegue antes de nossa data determinada pelo Ser Supremo, às vezes a morte pode chegar até nós em conseqüência dos nossos atos.

José Beniste no Livro Òrun Àyé diz o seguinte:

“Embora a morte seja inevitável, e imprevisível, vimos que ela pode sofrer alterações através da intervenção de Òrúnmìlà ou de qualquer outro òrìsà junto a a Olódùmarè, e isto é previsto em outro mito, quando Èsù consegue subornar o filho de Ikú, que revela o modo pelo qual Ikú matava com o uso de uma clava, a fonte indispensável de seu poder.

Sem essa clava, Ikú tornava-se impotente. Èsù foi ajudado por Ajàpàá, a tartaruga, que conseguiu o que desejava, conforme o dito Ajàpàá gbé òrúkú l’owó Ikú – “A tartaruga tirou a clava das mãos de Ikú”.

Posteriormente, fez um pato com Òrúnmìlà, com a condição dele ajuda-lo a recobrar a sua clava, em troca, Ikú só levaria aqueles que não se colocarem sob a proteção de Òrúnmìlà ou aqueles que estivessem com a data marcada para o fim de suas vidas na Terra”

Por isso é sempre bom que as pessoas façam uma acompanhamento de sua situação, pedindo ao seu Bàbàlòrisà(Pai de Santo) ou procurando um Bàbàláwo(Pai dono detentor dos segredos ou Sacerdote de Ifá) para saber se anda tudo em ordem.


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Referência Bibliográfica - José Beniste - Òrun Àiyé O Encontro de dois mundos.

ÌKÚ - A MORTE - 1ª PARTE

A morte é vista como um agente natural criado pelo Ser Supremo, que atua em determinada fase da vida, Ìkú é um personagem masculino e sua lógica é voltada para as pessoas que dadas as certas condições devem viver até uma idade avançada.

Por isso quando vemos que uma pessoa mais nova falece, o fato é considerado uma tragédia e quando isto ocorre com uma pessoa idosa isso é ocasião para se alegrar.

Vamos citar agora dois Ìtàn do odú Òyèkú Méjì, onde um deles nos relata como a morte começou a matar depois que sua mãe foi espancada e morta na praça do mercado.

1-Odú Òyékú Meji:

Níjo ti won noàyá ykú nígbè
Lójà Ejìgbòmekùn
Ikú gbó
Ikú han bíi gáte
Ikú mérin se késé
Ó fefón sikun fà
Ó fàkekèé pa késé ijà mésè danindànindanin
A íà fún Olójòngbòdú
Obìnrin Ikú
Wón pè é lóòórò kùtùkùtù
Wón ni kín ni Ikú okoo rè ò gbodò
Ti ó fi npomo dómoó kri?
Ó ní Ikú, oko òun ò gbdò jekú
Wón ní bó bá jeku nhó?
Ó ní owó Ikú a máa wa iróróró iróróró
Ó ní òun Ikú, oko òun, ò gbodò jeja
Wón ní bó bá jeja nkó?
Ó ní esè Ikú a máa gbón irìrìrì irìrìrì
Ó ni Ikú, oko òun, ò gbodò je yin pépéiye
Wón ní bó bá jeyin pépéiye nkó?
Ó ní Ikú a máa bì igòròrò igòròrò

1-Tradução: (livre )

No dia em que a mãe da morte foi espancada
No mercado de Ejìgbòmekùn
A morte ouviu
E gritou alto, enfurecida
A morte fez do elefante a esposa de seu cavalo
Ele fez o búfalo sua corda
Fez o escorpião o seu esporão bem firme pronto para luta.
Nós consultamos Ifá para Olójòngbòdú
Mulher de Ikú
Ela foi chamada cedo, pela manhã
Eles perguntaram o que seu marido não podia comer
Que o tornasse capaz de matar outros filhos de pessoas ao redor?
Ela disse que a Morte, seu marido, não podia comer ratos
Eles perguntaram o que aconteceria se ele comesse rato?
Ela disse que as mãos da morte tremeriam sem parar
Ela disse que a Morte, seu marido, não podia comer peixe
Eles perguntaram o que aconteceria se ele comesse peixe?
Ela disse que a Morte seu marido, não podia comer ovo de pata
Eles perguntaram o que aconteceria se ele comesse ovo de pata?
Ela disse que a Morte vomitaria sem parar.

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..... Continua

ITAN TI ODU ATI ORISA - ITAN TI ODÙ OKANRAN


1) Shangô queria ser muito poderoso e respeitado e para isto consultou Ifá. Na consulta surgiu Okanran Meji, que determinou um sacrifício, que iriam garantir ao orixás tudo que desejava.Feito o ebó, Todas as vezes que Shangô abria a boca para falar, sua voz saia possante como um trovão e inúmeras labaredas acompanhavam suas palavras.

Diante do poder de seu marido Oya resolveu consultar o Oráculo com a finalidade de se tornar tão poderoso quanto ele. Na consulta surgiu Okanran Meji, que lhe determinou o mesmo ebó.
Quando Shangô descobriu que sua mulher havia adquirido um poder igual ao seu, ficou furioso e começou a maldizer Ifá por haver proporcionado tamanho poder a uma simples mulher.

Humilhada, Oyá recorreu a Olorun para que desse um paradeiro ao impasse. Olorun determinou então que a partir daquele dia, a vós de Shangô soaria como o trovão e que provocaria incêndios onde ele bem entendesse, mas para que isto pudesse acontecer, seria necessário que Oya, falasse primeiro, para que o fogo de suas palavras (os raios) provocasse o surgimento do som das palavras de Shangô (o trovão), assim como o fogo que elas produzem sobre a terra (os incêndios provocados pelos raios que se projetam sobre a terra).

E por este motivo até hoje, não se pode ouvir o ribombar do trovão sem que antes, um raio ilumine o céu.
Este Ifá garante bom resultado naquilo que se pretende, por mais difícil que possa parecer principalmente se o Ebora que se apresentar para solucionar o problema, for Shangô ou Oya. 





2) Na antigüidade o Galo era um dos maiores Babalawo e sua fama corria longe.
O Rei de um povoado mandou convidá-lo, para lhe fazer uma consulta sobre a grande seca que assolava aquela terra.

Antes de partir, o Galo Consultou o seu Ifá, surgindo Okanran Meji, que exigiu um sacrifício de sete cacetes, sete acarajés, um preá, epo pupa, mel e velas.Oferecido o ebó, lá se foi o galo.
Quando chegou a porta da cidade, o porteiro lhe advertiu que não poderia entrar assim, sem fazer alguma declaração sobre sua procedência.

Ouvindo estas palavras, o Galo revoltou-se e tirando-se debaixo das asas os cacetinhos que trazia, fez uso deles, dando na cabeça do porteiro, provocando um grande derramamento de sangue. Indignado, o homem rogou-lhe pragas de uma forma tal, que em poucos minutos os astros se transformaram em tempestade. Roncou muita trovoada, foi um verdadeiro horror.
Debaixo da tempestade seguiu o galo, direto para a casa do Rei do lugar e lá chegando, o soberano lhe disse: “É grande é teu poder! Só a tua presença faz chover abundantemente!”.

Mandou seus servos dar-lhe alimentos e um poleiro no fundo da casa, com grandes admirações e louvores.
Para quem se aplica, este Itan prediz que a pessoa se acha diante de um grande perigo, que deverá enfrentar com muita coragem e disposição, para que saia vitoriosa.
Ebó: um ekú, sete cacetes de madeira, sete acarajés, epo pupa, mel, aguardente e sete moedas. Passa-se tudo no corpo do cliente, arruma-se em um alguidar, sacrifica-se o ekú em cima, entrega-se a Exú e despacha-se em uma estrada longa.
Mandaram Exú fazer um ebó, com o objetivo de obter fortuna rapidamente e de forma imprevista.

Depois de oferecer o sacrifício, Exú empreendeu viagem rumo a cidade de Ijelu.
Lá chegando, foi hospedar-se na casa de um morador qualquer da cidade, contrariando os costumes da época, que determinavam que qualquer estrangeiro recém chegado receberia acolhida no palácio real.

Alta madrugada, enquanto todos dormiam, Exú levantou-se sorrateiramente e ateou fogo às palhas que serviam de telhado à construção em que estava abrigado, depois do que, começou a gritar por socorro, produzindo enorme alarido, o que acordou todos os moradores da localidade.

Exú gritava e esbravejava, afirmando que o fogo, cuja origem desconhecia, havia consumido uma enorme fortuna, que trouxera embrulhada em seus pertences, que como muitos testemunharam, foram confiados ao dono da casa.
Na verdade, ao chegar, Exú entregou ao seu hospedeiro um grande fardo, dentro do qual, segundo declaração sua, havia um grande tesouro, fato este, que foi testemunhado por enumeras pessoas do local.

Rapidamente, a notícia chegou aos ouvidos do Rei que, segundo a lei do país deveria indenizar a vitima de todo o prejuízo ocasionado pelo sinistro.
Ao tomar conhecimento do grande valor da indenização e ciente de não possuir meios para saldá-la, o rei encontrou, como única solução, entregar seu trono e sua coroa a Exú, com a condição de poder continuar, com toda sua família, residindo no palácio.

Diante da proposta, Exú aceitou imediatamente, passando a ser deste então o rei de Ijelu.
Para quem se faz esta consulta, pode-se garantir a aquisição de fortuna ou melhora substancial de situação financeira, fim de dificuldades e estabilização. 


Fonte - Conhecimento Popular...



O DIREITO A RELIGIÃO NO BRASIL

A Constituição Federal consagra como direito fundamental a liberdade de religião, prescrevendo que o Brasil é um país laico. Com essa afirmação queremos dizer que, consoante a vigente Constituição Federal, o Estado deve se preocupar em proporcionar a seus cidadãos um clima de perfeita compreensão religiosa, proscrevendo a intolerância e o fanatismo.
Deve existir uma divisão muito acentuada entre o Estado e a Igreja (religiões em geral), não podendo existir nenhuma religião oficial, devendo, porém, o Estado prestar proteção e garantia ao livre exercício de todas as religiões.
O fato de ser um país secular, com separação quase que total entre Estado e Religião, não impede que tenhamos em nossa Constituição algumas referências ao modo como deve ser conduzido o Brasil no campo religioso. Tal fato se dá uma vez que o Constituinte reconheceu o caráter inegavelmente benéfico da existência de todas as religiões para a sociedade, seja em virtude da pregação para o fortalecimento da família, estipulação de princípios morais e éticos que acabam por aperfeiçoar os indivíduos, o estímulo à caridade, ou simplesmente pelas obras sociais benevolentes praticadas pelas próprias instituições.
A liberdade religiosa foi expressamente assegurada uma vez que esta liberdade faz parte do rol dos direitos fundamentais, sendo considerada por alguns juristas como uma liberdade primária. A liberdade de religião não está restrita à proteção aos cultos e tradições e crenças das religiões tradicionais (Católica, Judaica e Muçulmana), não havendo sequer diferença ontológica (para efeitos constitucionais) entre religiões e seitas religiosas. Creio que o critério a ser utilizado para se saber se o Estado deve dar proteção aos ritos, costumes e tradições de determinada organização religiosa não pode estar vinculado ao nome da religião, mas sim aos seus objetivos.
Se a organização tiver por objetivo o engrandecimento do indivíduo, a busca de seu aperfeiçoamento em prol de toda a sociedade e a prática da filantropia, deve gozar da proteção do Estado.Por outro lado, existem organizações que possuem os objetivos mencionados e mesmo assim não podem ser enquadradas no conceito de organização religiosa (a maçonaria é um exemplo desse tipo de sociedade).
Penso que em tais casos o Estado é obrigado a prestar o mesmo tipo de proteção dispensada às organizações religiosas, uma que vez existe uma coincidência de valores a serem protegidos, ou seja, as religiões são protegidas pelo Estado simplesmente porque as suas existências acabam por beneficiar toda a sociedade (esse benefício deve ser verificado objetivamente, não bastante para tanto o simples beneficiamento para a alma dos indivíduos em um Mundo Superior — os atos, ou melhor, a conseqüência dos atos, deve ser sentida nesse nosso mundo).
Existindo uma coincidência de valores protegidos, deve existir uma coincidência de proteção. Devemos ampliar ainda mais o conceito de liberdade de religião para abranger também o direito de proteção aos não-crentes, ou seja, às pessoas que possuem uma posição ética, não propriamente religiosa (já que não dá lugar à adoção de um determinado credo religioso), saindo, em certa medida do âmbito da fé, uma vez que a liberdade preconizada também é uma liberdade de fé e de crença, devendo ser enquadrada na liberdade religiosa e não simplesmente na liberdade de pensamento. (uol)
De facto, o princípio laico, enquanto princípio da separação entre o Estado e as confissões religiosas, tem a ver essencialmente com o Estado e não com a sociedade ou com os cidadãos. O Estado bem como a escola pública devem ser laicos, mas a sociedade e os cidadãos não têm de o ser.
O Estado deve ser religiosamente neutro, não podendo favorecer nenhuma religião, mas não tem de impor a neutralidade religiosa aos cidadãos nos espaços públicos (aliás, porquê só nas escolas e não também noutros estabelecimentos públicos, como serviços de saúde, etc.?). Nem o Estado nem as escolas públicas devem adoptar símbolos religiosos (nomeadamente a cruz, como era tradicional nas escolas dos países católicos), mas só por si o princípio laico não constitui razão para proibir o seu uso pelos cidadãos.
O mais até onde se pode e deve ir é a proibição de uso de símbolos religiosos pelos docentes e demais responsáveis das escolas, enquanto tais e no exercício de funções públicas, visto que nessa qualidade eles representam o Estado (assim sucede na Alemanha, onde o Tribunal Constitucional deu luz verde à proibição do véu islâ Independentemente da sua suposta fundamentação, haveria que compatibilizar a referida proibição com a liberdade religiosa, um dos direitos fundamentais das pessoas em qualquer catálogo de direitos humanos.
Ora, por menos amplo que seja o âmbito de protecção da liberdade religiosa (liberdade de crença, liberdade de culto, não se ser prejudicado por motivo de religião, objecção de consciência por razões religiosas, etc.), haverá de convir-se que dentro desse âmbito cabe em princípio a liberdade de cada um de, querendo, mostrar publicamente a sua profissão religiosa (salvo, porventura, em casos especiais em que isso envolva uma ‘’provocação’’ da liberdade religiosa de outros).
Nada pior para o princípio laico do que ser invocado em vão para justificar restrições indevidas à liberdade religiosa. Entendido na sua racionalidade própria, o princípio laico tem a ver com a proibição da identificação religiosa do Estado (bem com a intromissão das igrejas no Estado).
Nesse entendimento ele não só não conflitua com a liberdade religiosa, como, ao invés, é uma garantia dela.

Texto extraido do Blog
(www.causa-nossa.blogspot.com)

CANDOMBLES - JÊJÊ - 4ª PARTE

Gaiaku Luiza
Pai Miguel Grosso - Deuandá
 
 
4ª PARTE FINAL

4º.Depoimento de José Gomes de Lima – Zezinho da Boa Viagem, Congresso Afro-indígena, 1994:


Quem trouxe os mahin para Cachoeira de São Félix foram os “tios”. Eles se dividiram em cachoeira porque junto com eles, em outra levada, vieram Tixarene, Zé do Brexó e outras pessoas mais que fundaram suas roças.

Vovô Ventura e Gayaku Ludovica fundaram a roça do Kwe Seja Undê que é a roça de baixo; Tixarebe fundou a roça de cima, quer dizer, duas nações jeje a vinte metros uma da outra...quando morre uma mãe-de-santo, nosso pai que descende de Komadavit, então é ele quem aponta a pessoa que vai ficar no trono.

A minha primeira zeladora foi Iyá Fortunata, Baiana de Pina. Filha de Oxum e Oyá. Posteriormente fui iniciado pelas mãos de Tata Fumutinho em São João de Meriti, Rio de Janeiro”

Tata Fumutinho foi o primeiro homem feito no Seja Undê em 25/12/1912. Veio para o Rio em 1930 abrindo sua casa mais tarde em 1936.

Luiza Franquelina da Rocha, nasceu em 1909 e é mais conhecida como Gayaku Luiza do Humpame Huntoloji, no alto da levada em cachoeira. È filha carnal do pejigan do Seja Undê.

Inicialmente foi feita no ritual ketu, sendo mais tarde “refeita” no ritual jeje por Gayaku Posusi Rumaninha ( Maria Romana Moreira) no candomblé do Bogun em 1945, na qualidade de rumbono.

Gayaku Rumaninha não tinha terreiro fixo, por ser muito conceituada tinha acesso a todos, tendo sido “ Dere “, mãe-pequena do Bate Folha, advindo daí, talvez, a influência de ritos jeje no ritual de Angola. Faleceu em 1956 com 115 anos de idade.

Os avós maternos de Dila de Obaluaye tinham cargo no candomblé de Rozena de Besen: Afonsekoloanoo de Sango, foi o primeiro pejigan e Adpan Noeji foi feita de Osumare.
Quando Aninha morreu, Dila tirou a mão com Mejitó, que lhe abriu a casa.

Mejitó, Adelaide do Espírito Santo, também conhecida como Donontinha, foi iniciada com 7 anos de idade em 1891, pois era costume fazer iniciação quando criança.

Era de Vodunjo e o nome dado foi Zinvode.Mudou o candomblé do bairro de Cavalcante para a Rua Cecília em Coelho da Rocha, próximo à atual sede do Àsé Òpó Àfònjá. Com quem mantinha boas relações com a dirigente da época, Agripina de Souza. Tirou dois barcos com seis pessoas, vindo a falecer em 1956.

Para finalizar também temos uma outra casa de Jeje na Bahia de nome àsé Póeji, na cacunda de Yaya, com ritual SAVALU e fundada por Gayaku Satu de Cachoeira.

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Texto: Notas dos Candomblés Jejes – do livro “ Àwon omi Òsàlá
As águas de Oxalá “ Autor JOSE BENISTE -
Editora Bertrand Brasil – ISBN-85-286-0965-0

CANDOMBLES JÊJÊ - 3ª PARTE

3ª PARTE

3º. Depoimento de Constância de Avimaje, Salvador , Bahia, Painel Cultural, fevereiro de 1996:


“ Atualmente os praticantes da ritualística jeje são oroiundos de dois núcleos, ambos com sede no estado da Bahia; o Seja Undê, em cachoeira e o Bogun em Salvador.

Foi a africana Ludovica Pessoa quem fundou o “ Zô Godô Male Rundô “ em Salvador dando origem então ao denominado Candomblé Jeje.
Após a solidificação do Bogun, Ludovica fundou em Cachoeira o Seja Undê, empossando ali´Maria Luiza Gonzaga de Souza conhecida como “Sinhá Maria Ogorinsi Misimi”.

Durante anos as duas casas funcionaram em uníssono, com o Bogun servindode matriz. Depois da morte de Maria Ogorensi, o Seja Undê permaneceu fechado por muito tempo, embora o carrgo maior da casa já tivesse sido outorgado pela própria a Dionízia da Conceição, ou Maria Bale que somente muito tempo depois viria assumir suas funções.

Na época Maria Bale que fazia parte do jeje Modubi na roça de Zé do Brechió, quando assumiu o Seja Undê plantou a casa de Kututó(Egun) introduzindo assim na casa Mahi fundamentos de outra ramificação jeje.

Como no Jeje Mahi não é permitido casa de Kututó, a roça começou a decair. Maria Bale recolheu durante todo o tempo em que ali esteve três “barcos”, sendo que uma das componentes do primeiro barco Adalgisa, conhecida como Sinhá Pararasi, seria a escolhida para substituí-la por ocasião de seu falecimento.

Já no comando da casa Parrasi recolheu alguns barcos... a maioria dos iniciados daquela época já faleceu, o que dificulta qualquer tentativa de aprofundamento nas pesquisas por nós elaboradas.

Ainda na gestão de Pararasi, a roça conhece uma nova fase de abandono e decadência e para que não acabasse e fosse transformada em “pasto de gado” Besen ordenou que Gayaku Aguési assumisse o comando da mesma.

Com orientação de proceder a todas as obrigações anuais que já há algum tempo vinham sendo negligenciadas contando com o auxilio de Augusta Lokôsi e da própria Pararasi.

Segundo as tradições do jeje, não se recolhe barco com número par de iniciados, e Gayaku Aguési, desprezando este fundamento, recolheu um barco de dois – Oxum e Azanzun, a partir de então a casa novamente decaiu vertiginosamente.


Em 1962, Zezinho da Boa Vigem, filho de Tata Fumutinho, neto de Maria Agorinsi, visitando sua raiz de origem que na época estava entregue aos cuidados do Ogan caboclo de cachoeira, que viria a falecer pouco depois , sendo substituído por Ogan Babosa, constatou a situação da casa.

Uma forte amizade se estabeleceu entre os dois tendo Zezinho prestado substancial ajuda à casa, recebendo em troca fundamentos até então guardados a 7 chaves e inacessíveis ao cariocas.

CANDOMBLES JÊJÊ - 2ª PARTE

2ª PARTE

2º. Depoimento de Glorinha Toqueno, Orunmila ( sem data ) :


“ Eu filha-de-santo de Mejitó, que por sua vez foi feita por Gayaku Rosena, do axé Pódaba, o primeiro axé no Rio de Janeiro. A exemplo de Gayaku Rosena, fez poucos filhos de santo, a saber; Joana da cruz de Omolu, que por sinal após a morte de Mejitó foi Mãe pequena de Djalma de Lalu, que, por sua vez prestava-lhe muitos serviços, como catar folhas etc.

D.Isaura de Omolu, Dna Amância de Xangô, mais especificamente de Acorombé, eu, de Aziri e Natalina de Oxum. Afora isto ela confirmou vários Ogans e Ekedjis como; Luiz Ogan de Vodunjó, pai carnal de natalina; Maria Adamastor ekedji de Ogunte, uma irmã de santo de Megitó.

Mariquinha que era Runsó da casa, Bento de Sogbo, Ogan Acendino e seu filho Roberto ambos de Gú; Marcelino se não me engano, Olissá e minha tia Teresa que é Rozegan da casa, uma função dedicada aos cuidado das quartinhas ou seja, dos Gonzen e dos Grá também.

Existem três axés grandes: o Pózerren e o Póeji da Bahia e o Pódaba aqui no Rio. Eu fui feita no Pódaba onde havia este “ Oro “; antes do “santo”! vem o Grá.

O GRÁ é como se fosse a parte selvagem. Eles iam com Megitó e se embrenhavam no mato para buscar folhas e seus bichos. Tinha alguns que voltavam até com cobra. Não falavam, comunicavam-se por sons.

Eram mantidos num cômodo...avisavam quando vinha alguém...somente Megitó e Tia Teresa lidavam com eles..o GRÁ é antes de fazer o “santo”...é chamado após um determinado tempo mandado embora para que a pessoa possa receber seu vodun. Uma vez que foi, não volta nunca mais. “

CANDOMBLES JÊJÊ - 1ª PARTE


1ª  PARTE

1º. Depoimento do Gumbono Jorge de Yemanjá, Malungo, julho de 1995.


“ A vinda do Axé de Baconodavice, no início do século 19, chega a Cachoeira de São Felix. Agotime, uma das esposas de Agongolo, rei do Dahomé. Com a morte de Agongolo o trono foi usurpado por um de seus filhos, Adandosan, em detrimento de Ghezo, herdeiro legítimo.

Adandosan não só prendeu seu irmão como vendeu sua mãe como escrava para o Brasil. Ghezo, porém contando com a ajuda do traficante brasileiro Feliz de Souza, o Xaxá de Ajudá, recuperou o trono. Já no poder Ghezo enviou seis embaixadores ao Brasil à procura de sua mãe; contudo se não obteve sucesso é porque a esta altura, esta já se encontrava no Maranhão depois de ter fundado o “Kwe Seja Undê“, hoje conhecido por Terreiro do Ventura e cujo primeiro “barco” saiu em 1813.

Após a partida de Agotime para São Luiz o Kwe Seja Undê somente veio a realizar feitura de iaô em 25 de dezembro de 1912, “barco” tirado por Gayaku Angorense de Obaluaie e composto por oito Vodunsis e dois Ogans, do qual fazia parte Antonio Pinto de Oliveira, Fomotinho de Oxum Dei.

Este chegando ao Rio de janeiro em 1930, após ter tirado seu primeiro iaô ( Sebastião da Prata – Ajale Ofan Dejá - conhecido por Baba Beija-Flor ) na rua rua do Bispo, na casa Kwe Seja Nasso, na estrada do Portela, 606 – Osvaldo Cruz, a 16 de janeiro de 1936.

Já no seu terreiro, do primeiro “barco” fizeram parte Marcionilio de Yansan e Olegário de Oxossi e foi confirmado o Ogan Rungebê, Agostinho. Em seguida em 1937 Almerinda de Oxossi, em 1940, Djalma de Lalu, em 1949 Antonio cabeludo, em 1950 Jorge de Oxossi, Esmeralda de Xangô e Leandro de Ogun.

Quanto à origem da denominação de “Tata fumutinho” deve-se a seu íntimo contato com Manoel Bernardino de Yansan do Bate Folha; Manoel Ciriaco de Xangô, do Tumba Junsara e Manoel de Oxossi, Manasandaió, todos de nação Angola. Tata Fumitinho faleceu em 26/06/1966 e o Zerin foi oficiado por Ebomi Dila na casa de Djalma de lalu “

2) Ref. À nota acima. O autor faz algumas considerações: Na Agotime nasceu em 1770:Rei Ghezo (1818-1858) e este quando atingiu a maioridade depôs seu irmão Adandozan e para riscá-lo da memória do país, enviou ao Brasil ao tempo de Don João VI o trono de Adandozan e outros objetos seus os quais se encontram no Museu Nacional do Rio de Janeiro.