sábado, 16 de outubro de 2010

Fatumbi: O destino de Verger - Continuação 6


O interesse brasileiro e africano pela cultura compartilhada estimularia ainda mais o trânsito de
religiosos de um lado para o outro do oceano. Verger teve, assim, um papel fundamental no processo de
valorização da África no desenvolvimento das religiões afro-brasileiras, nas quais o modelo nagô assumiu
preponderância nos meios intelectuais e acadêmicos.
A acolhida de Verger pelo candomblé, a partir dos anos 40, pode ser compreendida não apenas em
termos de sua personalidade discreta e respeitosa em relação aos segredos que lhe confiaram, mas também
por um contexto histórico de relacionamento entre o povo-de-santo e as elites brancas que deste se
aproximaram. Os cargos de prestígio que ocupou, na condição de pesquisador e branco, desde o fim do
século XIX podiam ser conferidos a simpatizantes do candomblé provenientes de grupos sociais diversos. A
atribuição destes cargos (ogãs, obás, equedes) permitiu aos terreiros estabelecerem alianças em diversos
níveis (social, político e econômico) numa época em que os cultos eram estigmatizados. Essa estratégia de
autopreservação e legitimação imporia um duplo papel aos pesquisadores, intelectuais, artistas e políticos
que, assumindo um compromisso com o grupo religioso, ver-se-iam na condição ambígua de serem também
intérpretes, porta-vozes, defensores e divulgadores da religião. Verger, entre eles, parece ter sido um dos
que melhor representaram esse papel; talvez por se recusar a participar ativamente da academia, onde não
assumiu posições teóricas sobre o que pesquisava de forma livre, coerentemente com a própria
personalidade e biografia, e por pouco se interessar sobre o porquê das coisas.

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